Comentário a Jó 1.13-22 - Parte 2


joparte2Após saber da morte dos filhos, "Jó se levantou, rasgou o seu manto, rapou a sua cabeça, e se lançou em terra, e adorou" (v. 20). Ele se sujeitou à vontade do Senhor de uma forma tão resignada, que somente alguém dominado pelo Espírito Santo de Deus poderia assim agir. É fantástica a assertiva bíblica de que "e adorou", mesmo diante de todas as terríveis notícias, de ver o seu mundo virado ao avesso, de sofrer e entristecer; o coração submisso de Jó contemplou a soberania de Deus, Seu poder e sabedoria, restando-lhe, inevitavelmente, adorá-lO; reconhecendo a sua finitude e dependência, confessando por legítimo o que foi dito do homem: "porquanto és e em te tornarás" (Gn 3.19).
E mais, convencido de que não tinha nenhum direito diante de Deus, de que não poderia apelar a nada, nem mesmo como homem justo, e de que Deus detinha todas as prerrogativas sobre ele como o genuíno Senhor de tudo o que possuia, inclusive, o de dispor até mesmo da sua vida. Não é isso o que Jó nos disse? "Nu saí do ventre de minha mãe e nu tornarei para lá; o Senhor o deu, e o Senhor o tomou: bendito seja o nome do Senhor" (v.21).
Ele reconheceu que o mal, ainda que seminalmente, é o bem nas mãos de Deus. "Provai, e vede que o Senhor é bom; bem-aventurado o homem que nele confia" (Sl 34.8). Não foi o que José constatou, de que Deus transformara o mal em bem (Gn 50.20)? E Paulo não se convenceu do mesmo? Ao escrever que"todas as coisas contribuem juntamente para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o seu propósito" (Rm 8.28)? Mesmo que seja o mal? E se o mal concorre para o bem, logo o mal não é o bem também? Usando as palavras do Natan Oliveira: "Para nós é mal... Mas para Deus, tudo concorre para o bem, logo até o mal visa um bem, logo não é mal...".
O mal não é mal quando procede de Deus, porque tudo quanto Deus faz é bom, isso é algo que há de se entender: por definição escriturística, Deus não pratica o mal. O mal é criação de Deus e está no nível das criaturas, portanto, somente pode ser realizado por elas. Somos nós, o diabo, e os anjos caídos que exercem e exercitam o mal, predestinado pelo Deus pessoal da Bíblia que o determinou inteligente e imutavelmente como todos os demais eventos no universo.
Quando Deus diz que faz o mal (p.ex., Is 45.7), usa de um antropomorfismo que é a forma de se fazer entender pela linguagem humana; e ao dizê-lo confirma que é o Supremo Soberano sobre tudo, e de que nada escapa-lhe, pois tudo procede da sua vontade, a qual é plenamente realizável, não havendo chance de ser frustrada. Portanto, não há outra força ou poder; Deus tem o poder absoluto, e tanto o bem como o mal são controlados por Ele.
Para nós há o mal e o bem porque Deus assim o estabeleceu através da Lei Moral. Mas a Lei Moral não vale para Deus, somente para as suas criaturas, pois está no nível da criação, sobre a qual Ele exerce autoridade, o pleno direito que tem como Criador de sujeitar todas as coisas à Sua vontade, sendo sempre benigno. Assim, Deus não está sujeito à Lei, visto tê-la criado para os homens, e não para Si (como o Criador pode se sujeitar ao objeto criado?); então, é impossível a Deus pecar, Ele não pode pecar, o pecado não exerce nenhuma influência sobre Deus (negativamente) que, como Juiz, pune o pecador (reação positiva contra a rebeldia), o qual é quem efetivamente comete o pecado, e sobre quem está a autoridade justa e santa de Deus.
Mas muitos dirão: "E a ira de Deus, é boa?". Para Deus (e devia ser para nós também), tudo o que Ele faz é e sempre será, em todas as situações, santo, perfeito e bom. Porque tanto a santidade, como a perfeição e a bondade têm em Deus o seu padrão único, não apenas máximo, mas singular. A ira de Deus é boa porque faz parte da Sua natureza, e por ela conhecemos a Sua justiça. Veja bem, se Deus não tivesse criado o pecado e o mal, como seria possível que conhecêssemos a Sua santidade e retidão, e assim pudesse manifestar a Sua ira? Sem o mal criado seria possível ver o bem em Deus? Sem o pecado criado seria possível reconhecê-lO santo e imaculado, e por ele manifestar a Sua equidade? Não. A menos que Deus criasse uma outra criatura que não fosse o homem. Então, por que escolheu criar o homem? Por que assim Ele quis, e ponto. A revelação bíblica não pode ser questionada quanto mais Deus; como Paulo deixou patente, inapelável: "Ó homem, quem és tu, que a Deus replicas? Porventura a coisa formada dirá ao que a formou: Por que me fizeste assim?" (Rm 9.20). É preciso dizer mais alguma coisa?
Jó entendeu que a sua condição diante de Deus, como criatura, o tornava integralmente submisso à Sua autoridade e vontade, e de que devia render-se em completa humildade, e assumir a sua inferioridade face ao Deus sábio e bom. Por isso o texto anuncia que, decisivamente, ele em tudo não pecou. Qual era o seu pecado possível? Contestar a vontade divina. Contestar os atos divinos. Contestar a sabedoria de Deus. E como muitos fazem, contestar a soberania de Deus sobre tudo e todos. Esses são pecados, porque ofendem o Ser de Deus, a Sua natureza, pela falta de fé, e a desconfiança de que Ele é capaz de decidir justamente.
Murmurar é, nada mais nada menos, o queixar-se de Deus, é considerar os Seus propósitos falhos, imperfeitos, injustos, e de que, em nossa soberba, podemos fazer melhor do que Ele faz. Jó poderia ter murmurado, porém não teve o mesmo pensamento que derrubou satanás e 1/3 dos anjos do céu; que levou Adão e Eva ao pecado; e que destruirá a cada um dos rebeldes que se atrever a intentá-lo.
Jó não pecou, porque assim Deus quis que agisse.
Portanto, mesmo rasgando suas vestes, rapando a cabeça, pranteando, e sofrendo como poucos, não atribuiu "a Deus falta alguma" (v.22).

Para ler a Parte 1 do comentário click AQUI
Para ler o comentário a Jó 1.1-12, click AQUI

0 comentários:

Postar um comentário

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...